12.6.11

Paralelo Desigual

Há pouco mais de dois anos, em abril de 2009, saiu meu primeiro livro de prosa-poética com o título de Elefante-Rei: Poemas B (quando eu ainda usava o nome de Antônio Alves Neto). Foi uma edição minúscula & o meu intuito não foi o de criar muito alarde, pois em todos os textos do livro, mantive o posicionamento/atmosfera extremamente confessional. Ao meu ver & orgulho, pude concretizar minha primeira manifestação artística: uma pequena obra de arte às escuras, sem pretensão & com a dignidade de um mero amador com um leque de idéias poéticas na cabeça. Por algum tempo quis me afastar completamente do livro, mudei a alcunha para Antônio LaCarne & hoje estou aqui a memorizar o que um dia fui. Relembrar faz parte da vida.



Paralelo Desigual

Intacto é um muro de pedras, e depois de mim vem o poço. O buraco no muro é um silêncio morto. Cumprimentem o primeiro sol, deitarei na cama para esticar os ossos e a visão do teto será a única paisagem. Sou autorizado a ter dois olhos míopes, mas alguém ao meu lado ousa dizer: "isso nunca será de sua posse".

Reconstruo a farsa: cumprimentem a segunda casa, as paredes do quarto estarão impressas nos pedaços de madeira das portas, na areia presa ao meu sapato. Ouça então um grito, não se trata de horror, é gemido agressivo, carta de alforria ao escravo livre.

Eles permitem que eu veja a palma de uma mão. Eles permitem que eu vá embora. Se volto, eu perco. Se continuo, estaco. Chorar é um vazio que o organismo rejeita. São raras as noites de frio, e o lençol é um manto devastador para os minutos de corpo-a-corpo.

Mantive meu segredo. Meus pés descalços confortavam as raízes das árvores. Num esconderijo recém descoberto fumei cigarros. Sou Antônio entre quinas e rodapés. Ao ruim do gosto tomo-lhe as pálpebras. Despeço-me do trem anunciando sua fuga: máquina veloz correndo indiferente.

Eis que transtornado exibo um rosto plastificado. No meio de uma surpresa doméstica somos cobras falantes, não temos gesto e o futuro nos desune. Nossas carcaças vivas abduzem mortes corriqueiras. Somos considerados culpados: vastidão transfigurada no anseio de um pedido. Eu, sem os adornos que escondem uma vergonha.

Aos poucos me distancio e me aproximo de mim mesmo. Perderás o medo em um dia de vida. Cobriremos o terceiro sexo com um possível terceiro braço.

Em revolta quebro as lápides que sustentam o alvo. Ao fazer uma pergunta perco toda a essência. Ser translúcido para conquistar o amor. Mas o que eu quero é um amor côncavo.

Aos poucos me distancio e me aproximo de mim mesmo. Aos poucos me reconheço.

13 comentários:

  1. Hei Antônio, valeu por interagir comigo!
    Acredito que as pessoas interativas são as mais interessantes em todos os sentidos.
    Vim conhecer o teu espaço gostei do que vi, achei a tua forma cultural interessante e gostei de muitos textos que li aqui.
    A partir de hoje estarei te seguindo, para absorver um pouco da tua cultura relevante!
    Saiba que ao teu lado , caminharei na minha eterna condição de aprendiz!
    NAMASTÊ!

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  2. É, um tanto diferente mesmo do que vem escrevendo, mas com o mesmo nível, peno eu.

    Poderia publicá-lo online.

    Abraços!

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  3. O autoconhecimento, mesmo sendo uma minúscula parte, já é o suficiente e, portanto, muito importante para o ser humano. Belo post. Muito profundo.

    Abraços e ótima semana pra ti.

    Furtado.

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  4. ...somos produto
    de nossa própria sucata...

    aquele abraço

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  5. Na vida vamos mudando aos poucos,,,vamos nos adaptando a nós mesmos...abraços de boa semana pra ti meu amigo.

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  6. Parabéns, não sabia que você tinha livro publicado.
    E você escreve muito bem!
    Beijos.

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  7. Belo post! aprecio muito teu blog, os textos são inspiradores e apaixonates! nem tenho mais palavras, mas basta-me uma:parabéns!!!

    BeijooO*

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  8. Você acrescenta e revela de forma extraordinária em seu texto sua total e complexa nudez,nudez essa grandiosa e apaixonante.Belíssimo texto...Fico feliz em ter vivenciado com você o nascimento do Elefante-Rei: Poemas B.
    Um beijo carinhoso, da sua... Joana Rosa.

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  9. Muito bom amigo, desejo-te sucesso,
    maravilha ter obras editadas, sabemos como é dificil este caminho.
    se puder ajudar, divulgar,
    fazer qq coisa pq favor será um prazer.

    gostei muito dos seus escritos...
    e vou voltar!

    obrigada pela visita ao meu blog.
    volte sempre. será sempre muitissimo bem vindo. e desde já sigo-te.

    eu tbem tenho alguns livros publicado, trabalhos em antologias e outros ...

    beijo grande querido

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  10. "& hoje estou aqui a memorizar o que um dia fui. " ? mas será que esse fui,não podes voltar a ser?
    Parabéns pelo livro,deves ter sido uma grande conquista!
    Beijos

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  11. Não vejo a hora da nossa botecagem se realizar, para podermos conversar mais sobre os absurdos da vida!

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  12. Rá, eu tenho esse livro!
    Aliás, é um dos presentes mais fabulosos que já recebi. Até hoje abro esse livro e releio uma coisa ou outra, me perco nos versos secos e absolutamente úmidos de mistério. Devo dizer que já até rendeu discussão (no bom sentido) a respeito dos artistas que são suas próprias criações artísticas.

    Porra, Antônio, já cansei de te dizer isso.
    Tu és tua própria obra.

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