4.5.11

com o pouco dinheiro que resta, tatuarei no punho um símbolo socialista do amor maldito

"Preciso ir muito devagar, mas a pressa de ficar bem me atrapalha"
Ana Cristina Cesar 

Antônio chega em casa, senta, disposto a escrever um relato às 22:46. Antônio volta de uma bebedeira com os amigos. Antônio está relativamente bêbado às 22:46 em diante. Espero ser o mais honesto possível, pacto comigo mesmo, impenetrabilidade que serve como consolo ao que deve ser dito, no caso, agora, pois eis a verdade: esperança de salvação em plena quarta-feira. Os cigarros já não são a melhor companhia, ando fumando demais & incapaz de sustentar o próprio fôlego.

(Intimamente, gostaria que determinadas pessoas nao lessem o que está por vir. É uma dor que não dói, vista de fora, relativa, imprópria aos incapazes de qualquer entendimento - independente de qualquer boa ação, intenção, relação.) Mas se eu não tenar me salvar, mesmo sob efeito do álcool, quem poderá dizer qualquer verdade? Quem poderá assumir o meu lugar? Falar sobre máscaras soa como um clichê de quem não sabe escrever, de quem quer escrever & não possui a palavra certa, no caso, eu, pois a literatura aqui é nula. A realidade em si não exige literatura, exige consolo, compreensão, arroz com feijão, carinho, entendimento que afaga...

Utilidade número um: desisti da viagem que possivelmente me salvaria. O plano seria estar sozinho, refletir sobre a vida, escrever o livro da vida, entender um milímetro de vida que me faça caminhar consciente de mim mesmo, como quem diz "eu aprendi a me amar".

Utilidade número dois: tempos de nuvens negras não se adequam ao hoje, as noites de desespero se concentram num passado onde não posso esquecer quem hoje vive feliz, ao lado de outro, & não se importa com qualquer palavra dita da minha boca.

Durante o dia, telefonemas não atendidos, eu a esperar um um alô. Fim de caso, luta inconstante, & J. deverá não estar ao meu lado na sexta onde beberemos, dançaremos em profusão?

Okay, sou uma pessoa que necessita de drogas, sem desculpas, não adianta tentar me redimir falsamente. O orgulho surge quando sou capaz de revelar aos incrédulos certas verdades. Não há vergonha. Mas por consideração, deixo de ser eu mesmo, nego ao dealer a oferta que me faria sentir bem, economizo dinheiro, volto pra casa com a sensação de que você é um filho da puta & não quero me importar, jamais. Mas o contrário prevalesce.

Outro cigarro no bico, unhas roídas ao sabugo, volta cambaleante ao lar, medo de assalto, J. que não atende aos meus telefonemas. Sim, sensação é a mesma & a atitude deve mudar: amargura versus amargura, e daí? Triste do homem que depende da aceitação do outro para se manifestar. Triste de qualquer realidade cu do mundo onde o homem não deve ser o homem em questão, visto de fora pra dentro, de dentro pra fora.

Você que me entende intimamente fecha os olhos & escreve qualquer coisa, não há boa intenção. Amanhã, acordar como um lindo cavalo no pasto, despero de quem está sozinho na multidão cega, impermeável, vítima da moda & do que não salva em vida.

Afinal, o meu intuito é a salvação, querida realidade.

(Antônio LaCarne às 23:15)  



5 comentários:

  1. Antes de ler o livro Morangos Mofados do Caio F. Abreu refleti, “por que morangos mofados? Mas, longo em seguida vário textos perambularam o entendimento ou o sentimento que havia enleado os dedos daquele exímio escrito que disse através de Lispector modesto e sincero “quanto a escrever, mais vale um cachorro vivo”, logo era aquele período muito parecido com o de agora. Depois Osman Lins diz “Achava belo, a essa época, ouvir um poeta dizer que escrevia pela mesma razão por que uma árvore dá frutos. Só bem mais tarde viera a descobrir ser um embuste aquela afetação: que o homem, por força, distinguia-se das árvores, e tinha de saber a razão de seus frutos, cabendo-lhe escolher os que haveria de dar, além de investigar a quem se destinavam, nem sempre oferecendo-os maduros, e sim podres, e até envenenados.” E já pensou oferecer uma escritura sobre a forma de absorção ou melhor desgutação de morangos mofados, podres, envenados de uma época como disse Heloisa Buarque de Holanda pela publicação de fatos sobre personagens cansados, querando uma grande mudança pra as fornteiras, de desligar-se do mundo “condenado”, pois quem nasceu pra voar, voe no rumo do Céu (...) Pássaros viajam ao redor da maquina, antes da Máquina e depois. E escrever independe, o voou ao céu é o rumo. Mas entendo tudo como uma autocrítica irônica, como uma perplexidade, como um ducto que leva a saída.

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  2. Tudo nas nossas vidas aconteceu como não planejado.

    - Eu te aceito, digo ao Inferno dos Astros.

    E assim sigo sem ler nem Clarice ou Caio, quanto menos Hilda.

    Abro mão de tudo o que valorizo.

    SEUS PUTO, PUTO, PUTO, puto, put...

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  3. Quando se está sem esperança, o melhor é se fingir de morto.

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  4. O risco de tocar a própria existência, é se desesperar com ela.

    Texto profundo é o que há por aqui sempre,

    Abraço!

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  5. "o risco de tocar a própria existência, é se desesperar com ela".

    sábias palavras, querido.

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