-
Vou decorar o número do teu telefone porque a bateria do meu celular
descarregou...
-
Tranquilo, liga aí que a gente marca uma cerveja.
Alguém
assim, moreno e muito concentrado, como todos nós queremos e eu me preocupava
com alguma circunstância, como se eu pudesse comparar vivências ou sei lá o
quê. Tudo era motivo para uma lista no caderninho, outro tópico a ser almejado,
ou o tempo que a gente não tem pra ler um livro de autoajuda. Aquelas coisas
que acontecem quando a noite paira suspensa numa madrugada de nada, quando tudo
o que se espera é a chegada do táxi, ou aquele idiota que se diz muito
intelectual e que teve a audácia de lançar uma opinião sobre mim e eu, em
hipótese alguma (seria também audácia?) jamais perderia meu tempo ao dizer o
nome. Coitado.
Enquanto
eu me esquivava das ciladas da mente, das ciladas potencializadas pela opinião
alheia, eu vi aquele cara cair de paraquedas no mundo quando, nos lapsos do
drama, eu lembrava daquela música da PJ Harvey sentada ao piano num programa de
TV inglês. Aquilo mexeu comigo e vira e mexe eu me espanto, me recuso a dormir
na hora exata; e ainda por cima dou boas gargalhadas ao meu reflexo no espelho,
tão bobo, e você com aquela pinta dos babacas. PJ cantava uma música arrasadora,
mas com a voz que falhava como as dores e os porquês, quase sem um pingo de
importância para a galera que se perde nos círculos da alegria, nos objetivos
amorosos, mas que na prática é puro buraco negro e também audácia. Um pingo de
sensibilidade negativo.
Aos
31 a ironia não tem mais graça, o corpo se descostura cedo ou tarde (a
paciência também). Aos poucos as coisas se afunilam e eu quero me afunilar
gostoso, principalmente quando os raros amigos se tornam cúmplices e, pronto para
o night out, observo pessoas incríveis que dançam sozinhas no meio da pista de
dança esboçando apenas frieza e olho de cristal maciço. Neste momento a dor não
se apodera e o alívio quer ser mais rápido, assim como a pista de dança. É que
balzaquianos são mais gostosos. Mas por favor não insista, cedo ou tarde a
verdade te engole.
Aí
em plena “eis a questão” das quartas-feiras, você e eu, os cansados de guerra,
porém gatos escaldados, cuspimos naquele prato merecido e vivemos outra vez. Ao
alcance não há saída de emergência, nem um boy de capricórnio. Tudo se resume
num limbo à queima roupa em pleno verão. Mas onde é o verão? Ou melhor, quem
viver, verão.
Círculávamos entre as
ruas sujos de nós mesmos, talvez às 3 da manhã, rondando de esquina em esquina,
shorts apertados, boca sedenta e nariz escorrendo. Partíamos em busca, voltávamos
para duas cervejas saideiras, o estardalhaço, o dia amanhecendo, o livro de
poemas amassado na bolsa, This Is How We Do da Katy Perry na cabeça enquanto
eu, muito atento, me inteirava da nova postagem do Xavier Dolan no Instagram.
Crônica de um sábado a noite? Incrível como me encontro em alguns dos seus textos! O melhor é que todos eles têm muito mais poesia do que encontro normalmente! Genial Antônio, parabéns.
ResponderExcluirEsse teu jeito de escrever, muito único.
ResponderExcluirMuito bom, Antonio! Me identifico em muitas passagens, principalmente quando era uma "criatura da noite"!
ResponderExcluirGrande abraço e sucesso!
Visitando seu blog, reconheci-me em alguns textos. Muito bom Antonio. Você tem nosso leitor. rs...
ResponderExcluir