Querida pessoa X,
Eu ainda tenho forças. Se eu pudesse, trataria de recompor as recompensas e te expulsar diretamente do meu círculo de obsessões. Cansei, por eternos momentos extremos, de me debruçar em mesas de bares, citar teu nome vão – aquele buraco cor de lodo que me engasga, mas que me fortaleceu com um pé na bunda quando precisei dar uma voltinha por cima.
Eu poderia ser mais uma dessas pessoas felizes – como o casal apaixonado da novela – com aquele brilho no olhar de quem se encanta com o mundo e sua fórmula de ups and downs. Mas é que a minha ousadia em ter me apaixonado por você me destruiu as pernas, o tato, e não consigo esboçar um sorriso diante das possibilidades. Tenho bebido demais, pensado em você nos instantes em que o happy hour com os amigos serviria de consolo e comunhão entre irmãos. Tenho exagerado nas guloseimas, e infelizmente adquiri um aumento de peso impróprio à minha estrutura de indivíduo calmo, discreto. Perdi o controle nessa insatisfação que é te enxergar em fotografias junto com aquele amor que te faz tão bem, enquanto me contento em ser expectador da tua vida e regurgitar a dor.
Inutilmente tenho culpado o destino por não saber controlar a raiva, e em revolta derrubei um jarro de flores num falso acidente doméstico. O tempo passou e continuo preso às correntes do abandono. Mas o desconforto se torna raro quando sei que o meu futuro depende de uma dose de sorte, pois já não sei o que esperar dos dias.
Penso em você ao inventar mentiras, ao responder que estou tão bem quanto o frescor dessa brisa que assanha nossos cabelos. O amor que se tornou uma lama imaginária presa à minha disponibilidade na noite, nos drinks que vêm e vão, na madrugada de volta pra casa quando converso com o taxista sobre a previsão do tempo.
Meses e meses, semanas com aquela puta dúvida de discar ou não o teu número para um simples oi de “vamos passar uma borracha sobre tudo isso”. O primeiro instante do dia ao abrir os olhos e enxergar no teto a imagem desenhada do teu corpo.
Mas ainda não encontrei uma cartada final para este lado b do amor e suas incógnitas. Talvez como exercício, eu esteja no caminho certo e decida traçar o primeiro passo de uma auto ajuda enviando esta carta pública para revistas de fino trato, assim como quem não quer nada, como quem quer tudo.
Y.
(Texto publicado no Don´t Touch My Moleskine)
Do amor e outras drogas, né?
ResponderExcluirNossa. Sou eu no ano de 2010! :S
ResponderExcluirSempre procurando motivos e respotas para os fatos, até qua chegou uma hora que cansei...
Nossa, que texto é esse?!?
ResponderExcluirDá pra sentir na pele - e no coração - essa dor.
Muito intenso e muito sincero.
"Penso em você ao inventar mentiras, ao responder que estou tão bem quanto o frescor dessa brisa que assanha nossos cabelos". Quem nunca fez isso?
esse texto é muito lindo!
ResponderExcluirJá tinha lido lá no Don't Touch!
:)
Gostei da maneira que foi escrito.
ResponderExcluirFicou muito, muito bom.
Flores.
Layout novo. Preciso de um disso.Encarar direito o lado B do amor. Preciso também. Tentar descansar do lado B. Também preciso. Deixar de achar que o amor é sempre essa coisinha bonita. Isso sim, isso sim eu preciso.
ResponderExcluirEstava lendo e obviamente colocando um nome no lugar do "pessoa X", pensando se não é melhor ser uma samambaia a tentar (e tentar e tentar e tentar...) essa coisa de amor e aí, misteriosamente, o iTunes resolveu desencavar sabe-se lá onde a clássica do Haddaway:
ResponderExcluirWhat is love?
Baby don't hurt me
Don't hurt me
No more
Ou seja, eurodance responde. E salva.
Miro, amo os seus comentários, pois além de inteligentes, possuem a vibe do "tirar sarro de si mesmo". o que é de um terrível bom gosto. :) O eurodance há de nos salvar.
Excluirabsolutamente incrível.
ResponderExcluirLeio neste texto alguma mágoa tua em relação ao amor, será? Óbviamente o lado B existe, mas é preciso saber conviver com isso, certo?
ResponderExcluirCurioso o teu comentário no meu cantinho que mereceu resposta em conformidade :)
Abraço
nessa tu rasgou o coração com a caneta Antônio, sério, que texto é esse? minha nossa!!
ResponderExcluireu abri um sorriso gigantesco no momento em que li seu comentário e redirecionei para esse blog lindo, seguindo muito mesmo, parabéns por seus textos, tô aqui lendo encantada. ;*
tá difil pra todo mundo
ResponderExcluir"aquele buraco cor de lodo que me engasga" - essa é a verdadeira descrição de um amor que tive por anos e me fez mal. Texto denso, sincero e direto, assim como as coisas devem ser.
ResponderExcluir;*
incrível como todo mundo tem uma história de amor dramática a ser superada, mas é isso aí, o tempo há de nos salvar.
ResponderExcluircontente por toda essa identificação, queridos.
:)
Obrigada pela visita, mocinho! :)
ResponderExcluirterrível, sórdida e cruelmente verdade. quando o desamor, o abandono, o nada nos destrói as pernas, como andar de novo, caralho? agora eu vivo o limbo de ainda não ter outras pernas crescidas o suficiente pra andar sem mancar e ao mesmo tempo ter abandonado um amor que eu tentei colocar no coração e que, embora fosse grande do tamanho do vazio que eu tinha dentro de mim, não foi o coração que me coube. será que um dia acho um que me caiba ainda que transborde? ou um dia vou me contentar com a cicatriz e um punhado de amores colecionados que nunca couberam no buraco?
ResponderExcluirDevastador! Valeu!
ResponderExcluirX + Y = equação complicada.
ResponderExcluira pergunta agora é o que é o amor, o que é isso, porque eu não sei? acho que não passa tudo de uma obsessão, mais uma doença mental que um sentimento, que torna inoperante aquele que o hospeda. acho que prefiro apenas continuar assim, perdido entre paixões.
ResponderExcluirEstar no lado B significa que já se passou pelo lado A. Às vezes isso conforta mas às vezes é exatamente o que machuca. Parafraseando Leoni, as flores e os dias de sol dão mais raiva pela falta que fazem.
ResponderExcluirBonito texto.
Putz, quem já não passou por essa fase? De paixão maluca por alguém que, simplesmente, não merece.
ResponderExcluirOi, meu nome é Natália e estou sóbria há 4 anos e meio. Agradeço todos os dias por ter me livrado da paixão pelo traste, pq.. era foda.
Uma vez assisti a um filme que era uma biografia do Modigliani e, logo no início do filme (ou era bem no final? sempre me confundo), a mulher dele diz algo do tipo "Have you ever loved someone so deeply that you condemned yourself to an eternity in hell? I did.". Me enxerguei. A única diferença é que hoje tenho a certeza de que esse tipo de sentimento é tudo, menos amor. Paixão, obsessão, possessividade e muitas outras coisas. Mas, amor? Não. Definitivamente não. O foda é aguentar todo o peso sobre o peito enquanto essa avalanche de sentimentos malucos não passa. F o d a.
Ah, esqueci de falar. Ela fala essa frase por suicidar-se grávida logo após a morte dele. Mas eu sempre interpretei com um outro sentido também, que é o que me valeu na época: o inferno de seguir vivendo com todo aquele peso no peito, com todo aquele relacionamento conturbado, repleto de jogos e trapaças, no qual, ainda que eu parecesse ganhar, eu sempre perdia.
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