25.4.13

trincadas até a alma


Eu queria muito que você entendesse que os dias chuvosos me ajudam a reciclar dramas.

É incrível, mas acho tudo uó e sem um pingo de sensibilidade.  Aí roubo a frase da senhora Lispector (hoje arroz de festa nas redes sociais) quando ela diz que “o mundo precisa mudar para que eu possa caber nele”.

Triste fato, o céu nubladíssimo destrói a coragem que eu deveria ter rumo ao trabalho em plena área metropolitana (e alagada) do meu Brasil.

Portanto, eu sou corajoso. Eu sou o pior e o melhor de minha espécie. Mas há quem diga: antes um marido rico e três filhos gordos...

Por isso acendo mais um cigarro e postergo o momento do banho, da escolha da roupa, das lentes de contato – arrumar a bolsa com livros, diários de classe e atitude de professor. Esse é o meu ato, o meu protesto numa espécie de coragem em plena quarta (de quinta) prestes a desabar outra tempestade.

(Três filhos gordos gerariam problemas insolúveis, apesar da beleza-fofurinha que eles exalam).

Aí desço as longas escadas do prédio, pois na minha opinião infantilizada, descer é mais complicado do que subir: você desaba e o chão desnivelado te espera, te engana, te propõe surpresas. A falta de mobilidade urbana vem e te afaga os bagos. Não há consolo. O marido rico é um totem imaginário dos sonhos. É nessas horas que bate a revolta emocional contra a vida amorosa dos artistas, das pessoas lindas, amadas e bem resolvidas de plantão.

Outro drama: é triste, meus caros, saber que no mundo há pessoas que ficam belíssimas em praticamente TODAS as fotos.

Mas no fundo, bem no fundo, o que eu queria dizer é que em determinados dias há aquele feeling “preciso me desapegar de certas coisas”. Algo tipo despedida em Las Vegas, sendo que Las Vegas não é Las Vegas, e sim o fundo do poço.

O bom dessa modernidade defasada das cidades é que no sábado tem o fuá, o baratismo que elas merecem. Todas estarão colocadíssimas e trincadas até a alma. É tempo de escolher o look certo e, infelizmente a máscara que você está disposto a usar para encarar sua puta vida.

Ayúdame, por favor.

Lá fora um sol escancarante fator 38 graus do absurdo.

17 comentários:

  1. Antônio, vamos sair pra beber?
    {falando sério, tô precisando}

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  2. Então é isso, escolher o look certo e colocar uma mascara pra encarar a vida? E na volta pra casa, quando você for se ajeitar pra deitar e não conseguir dormir? Talvez esse não seja um remédio. Então sai pra beber de cara lavada mesmo e com a primeira roupa que achar. Sai da rotina e pula uns três degraus da escada pra dá emoção. hehe.

    Acredite filho, todo mundo tem dias ruins e chatos. Até os artistas.

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  3. e quem é que não tá trincando?

    nossa, antônio, eu adorei esse texto. um dos melhores que eu já li aqui (e quantas vezes eu já não disse isso?).

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  4. Essa coisa súbita que aparece assim, "preciso desapegar" tem sido a agulha, cada vez que me vem uma agulhada vem a certeza da necessidade pra esvair da Maia (deusa oriental da ilusão). Que sigamos no caminho certo.

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  5. esse final de texto...

    gosto dos dias nublados, gosto do fuá, nem espero o sábado, aliás, acho que hoje completo minha terceira semana composta apenas por sábados. É o desemprego, o desespero, o desapego, a falta de vontade, sei lá.

    muito bonito!

    um abraço!

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  6. Ok, me identificando...
    Principalmente, na parte de pegar os diários de classe e ter atitude de professor....
    Seus textos continuam ótimos como sempre (sem mentira ou exagero) :)

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  7. Saudade desse cantinho, mas o bom filho a casa torna..rs
    Delicado seu texto!
    Aproveito pra avisar que acabo atualizar a acanhada Narroterapia com o segundo capitulo do conto Sempre Haverá Pássaros, e quero muito seus comentários.
    abraços
    Fabrício

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  8. Cheguei a você por um amigo que me disse: tem um blogueiro que me lembra você, seu texto. O Lacarne. Aí pum, cheguei, fiquei super lisonjeada, e deu vontade de "fazer a íntima".

    Beijo!

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    1. Thessa, quem foi esse blogueiro? Fiquei curioso! Ah, faça a íntima sim, adoro isso. :)

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  9. "revolta emocional contra a vida das pessoas lindas, amadas e bem resolvidas de plantão" define o sentimento. Inclusive, Las Vegas também. Só não vou pra lá por que não deve ser nem metade do que eu espero - e posso suportar tudo, mas a frustração eu não aguento.

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  10. antonio, que texto bom. todo autoral... como não tinha o costume de vir aqui antes, sempre. o tanto que você merece ser lido? de verdade.

    "É tempo de escolher o look certo e, infelizmente a máscara que você está disposto a usar para encarar sua puta vida." Que realidade! (Que triste!)

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  11. Antonio, que texto mais 'real' é esse? Poxa, fiquei impressionada com a quantidade de frases e situações que me identifiquei.

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  12. Quantas ilusões, Tonico (Tenho permissão para te apelidar? ). As seguintes frases:

    "É nessas horas que bate a revolta emocional contra a vida amorosa dos artistas, das pessoas lindas, amadas e bem resolvidas de plantão."

    "É tempo de escolher o look certo e, infelizmente a máscara que você está disposto a usar para encarar sua puta vida."

    Os artistas, as pessoas lindas, amadas e bem resolvidas, apenas usam máscaras well-done, em sua maioria de grife, outra parte em brechó bem chique. Até me desapontei em ler o final do teu texto, se houver gente bem resolvida, estão mortas - ao menos por dentro estão.

    Só mais pseudo que esta gente "amada" é o céu nublado. Eu olho e me pergunto "devo passar protetor solar? ta sem sol" mesmo sabendo que os raios solares ultrapassam as nuvens escuras, eu saio sem protetor, só pra sentir a coragem que eu tenho de me suicidar aos poucos.

    Abraços!

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  13. "o chão desnivelado te espera, te engana, te propõe surpresas". Sim, assim o é o tempo todo e talvez, assim precise ser.

    Bjos!

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