30.3.13

The Future


The Future é o segundo longa da escritora, atriz, roteirista, performer, diretora e artista Miranda July. É incrível, mas ela é um talento ambulante disposta a transformar as coisas mais simples em arte. O filme é uma produção entre Alemanha e Estados Unidos que estreou em 2011 no Festival de Sundance, e também concorreu ao Urso de Ouro no Festival de Berlim. 

Mesmo não sendo tão aclamado quanto sua primeira incursão no cinema como mente pensante por trás do roteiro, direção e atuação; Eu, Você e Todos Nós (Me, You and Everyone We Know) de 2005, também garantiu à Miranda o crédito de talento indie do cinema contemporâneo.


The Future conta a história de um casal, Sophie (Miranda July) e Jason (Hamish Linklater), que adota um gato de rua com a pata machucada. O ato de adoção soa como uma espécie de analogia entre animal e relação amorosa, ambas enfermas. Enquanto o animal se recupera numa clínica veterinária, os dois buscam uma fórmula, nitidamente inconsciente, de reafirmarem suas posições no mundo como duas pessoas que devem ou não manter seus laços de união.

Os dois personagens principais também convivem com dramas existenciais recorrentes, com a ideia de que, aos 30 anos, eles não possuam tempo e espaço suficientes para a realização de seus objetivos artísticos e pessoais. O que não é verdade.

O próprio título do filme idealiza o que está por vir, independente de qualquer ação planejada. Sophie e Jason tomam para si a perspectiva e o terror de que o futuro dominará suas vidas sem qualquer escolha; porém ambos não são vítimas do acaso e sofrem as consequências de suas atitudes. Como nós, pobres mortais. 

24.3.13

Clodie Vasli: De Passagem


A alegria não poderia ser maior em plena sexta-feira fatídica, quando finalmente pude ter em mãos o primeiro livro do dearest Clodie Vasli. Foi o maior presente que pude receber nestes dias tão ensolarados, repletos de tensão – aquela vibe recompensa do cotidiano que de vez em quando te sufoca e não deixa respirar.

Mas eis que me deparo com um embrulho que me enche de emoção. A expectativa de receber diretamente de Nottingham, na Inglaterra, os escritos de um grande amigo. Clodie é o que eu poderia descrever em simples palavras de extrema cumplicidade (mas com sentimentos genuínos) como um grande talento. Ele é coragem, é sabedoria que supera a banalidade de nossos dias. É mais que um orgulho tê-lo como amigo-talento, mesmo com a nossa distância de corpos: ele na Europa e eu no meu mundinho.

De Passagem é nome do livro. Trata-se de uma coletânea de crônicas, contos e fragmentos publicados em jornais, revistas e sites da internet. Foram escritos entre 2002 e 2012 em Porto Alegre, São Paulo e Londres. 

Com o livro em mãos, não pude resistir e o li de uma vez só. A emoção foi tão grande que logo no primeiro texto, A Carta, não pude conter as lágrimas. Mas o que se torna mais válido na literatura de Clodie é a simplicidade que em momento algum se torna frívola. Ele é conciso, direto, não perde tempo, e por trás de cada palavra há a vastidão de ideias e sensações que poucos são capazes de transmitir. 


De hoje em diante encaro o livro como um amuleto da sorte. Sempre o carregarei comigo na bolsa como uma espécie de guru da modernidade. A verdade é que essa obra é um leque de sensações que nos acompanham no decorrer da vida, e mesmo vítima do mundo e de suas pedras, Clodie jamais se rende. Suas palavras atraem conforto, uma sensação de autoajuda transmutada num piece of work vasto.

De Passagem nada mais é que a exuberância que faltava em 2013. É incrível, mas como se não bastasse, o livro vem embalado carinhosamente com colagens. É obra de arte versus obra de arte versus obra de arte. Nessa delicadeza também gráfica, Clodie consegue transformar o livro numa extensão nós. O meu, por exemplo, veio com a Kate Moss estampada em papel de presente arrancado de uma revista de moda. Além da lindíssima dedicatória, ganhei um cartão-postal da Vírginia Woolf como plus.

Mais uma vez eu me rendi à amizade, ao talento, ao senso de cumplicidade que nenhum dinheiro pode comprar. O mais bonito é saber que eles, o livro e o autor, fazem parte da minha história – e nós somos combustíveis para tanta inspiração.

* * *

Você pode comprar o livro em dólar (já que a editora é de fora) aqui. Ou se prefereir, pode entrar em contato com o próprio autor e adquirir um exemplar por um preço bem mais em conta aqui.

18.3.13

eu sempre


eu nunca estou confortável. e meus amigos percebem. eu sempre estou sofrendo por alguma merda. e meus amigos percebem. eu sempre estou entre a faca e o queijo na mão. e meus amigos percebem. eu sempre sofro por algum filho da puta. e meus amigos percebem. eu sempre sou uma pessoa legal que merece os frutos do destino. e meus amigos percebem. eu sempre exagero na cerveja. e meus amigos percebem. eu sempre uso drogas. e meus amigos percebem. eu sempre estou entre más companhias. e meus amigos percebem. eu sempre telefono às duas da manhã. e meus amigos percebem. eu sempre estou desestruturado, obsessivo, paranoico. e meus amigos percebem. eu sempre vou embora com a cabeça baixa. e meus amigos percebem. eu sempre anseio uma mudança. e meus amigos percebem. eu nunca sorrio pra valer. e meus amigos percebem. eu sempre peço conselhos. e meus amigos percebem. eu sempre faço a íntima. e meus amigos percebem. 

e você, que não me viu pra valer, percebe? entende? se identifica?

5.3.13

junk

Eu não preciso dessa história toda. Você aí parado me entende quando digo que já passou da hora &, aos 29, outro lance barra pesada vai tomar forma, assim como o jovem mancebo que voltou de Constantinopla cheio de novidades. Até eu mesmo fui capaz de dizer que acabei com tanto exagero, drogas, esquina da cidade rumo à festinha esdrúxula. O lance de tirar foto diante do espelho para que você, aí de bobeira, me persiga & me entenda & que não queira colidir nossos prédios no peito. Hugo Chávez morre. A Europa vira do avesso. Recebo e-mail com as palavras mais lindas de Fellipe pronto para observar o mundo. & ainda perdi tempo com a cabeça baixa, andando de lado, repensando o modo de reaver o perigo da noite na palma da mão. Tudo ao contrário, as extremidades distorcidas. A amiga que desistiu da amizade. A amiga que faz escova no cabelo. O amigo que telefona agradecendo o cumprimento. Eu que saio para comprar mais cigarro, contemplando o status de persona obcecada, bêbada & suja por dentro. O status número 2 que reavalia o modo de curar uma dor enquanto se escreve um livro, pois o meu livro terá o título de “Salão Chinês” & espero ventura, registro oportuno do momento. Cada vez mais devoro a paranoia a favor da poeta que requebra por aí cheia de beleza, inspiração, palavra certeira: flecha em nossos corações de monstro. De quebra, sou seu maior stalker. Hoje pensei que talvez haja algum problema psicossomático, a falta de grana na carteira, o arbusto que cresce & cutuca as partes íntimas. Enquanto isso, você esquece dos pormenores enquanto gasta tanta energia com esmalte & o tapete vermelho do Oscar. Mas era maravilhoso aquele vestido da Jessica Chastain. Aí me proponho a ser repetitivo, reclamar do calor, dos buracos no asfalto, dos truques do amor, daquele outro amigo que se deu mal enquanto patinava sobre o sexo dos homens acima de 40 anos. Uma armadilha, meus amigos. Uma armadilha que me preserva. Ou quando hétero ruim de cama & bocão afirma detalhes sobre uma noitada com a loura mais bonita do pedaço? Sim, eu acho incrível o que o querido Tadeu Sarmento escreve & cada palavra que ele diz soa como se eu fosse a menor das pessoas que também escreve. Ou quando quem eu considerava sexy & amigo se afastou por motivos óbvios, afinal amigo gay com sentimentozinho out of control é cilada, galera. Todas as segundas-feiras são embustes que abocanham o prazer de nossas genitálias. Amo você até o ponto em que a minha inspiração afoga as palavras doces que eu te diria ao pé do ouvido, porém love makes the world go round & é possível que a medicação, até certa altura, não faça o mínimo efeito. Desculpe a opinião sincera, eu estou vivendo.